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Publicado: 25 de outubro de 2025 às 11:08

Endividamento Recorde no Agro Brasileiro Desafia o Crédito Rural e Alerta o Mercado Financeiro

O agronegócio brasileiro registra endividamento em patamares históricos, impulsionado por custos elevados e queda nos preços das commodities, gerando a maior crise de crédito rural desde o Plano Real.

O agronegócio brasileiro, pilar da economia nacional, atravessa um momento de transição delicado, marcado por um endividamento recorde que pressiona o crédito rural e acende alertas no setor financeiro. Após anos de expansão acelerada e margens robustas, especialmente em soja e milho, o setor enfrenta uma desaceleração com custos operacionais em alta, preços internacionais em queda e capacidade de pagamento reduzida. Essa dinâmica resulta na maior crise de crédito agrícola desde o Plano Real, conforme análise da Farsul, afetando desde cooperativas até grandes bancos. No entanto, a resiliência dos produtores e a evolução para modelos de financiamento mais complexos oferecem caminhos para superação, com foco em produtividade e garantias inovadoras.

O endividamento, comum na agricultura devido à sazonalidade, se agravou nas últimas duas ou três safras, transformando um mecanismo de alavancagem em risco sistêmico. Instituições financeiras adotam cautela, mas veem na maior participação do setor privado uma oportunidade de especialização, reduzindo a dependência de recursos governamentais.

Cenário Atual: Causas do Endividamento e Inadimplência Crescente

O ciclo virtuoso do agro, que impulsionou o Brasil como maior exportador de commodities, deu lugar a um período de ajuste. Custos com insumos, fertilizantes e logística subiram até 30% nos últimos anos, enquanto preços da soja caíram 15% e do milho, 10% (dados Cepea, 2025). Produtores, que captaram agressivamente em tempos de bonança, agora enfrentam margens curtas, elevando a inadimplência em 25% no crédito rural (Banco Central, setembro 2025).

  • Principais Causas:
    • Margens apertadas: Duas safras consecutivas com lucros 40% menores em culturas chave.
    • Investimentos excessivos: Expansão de terras e máquinas financiadas em 2022-2023, agora onerosas com juros a 12% ao ano.
    • Dependência de crédito: 70% dos produtores usam financiamentos de cooperativas (45%), revendas (20%) e bancos (25%).

A Farsul alerta que essa crise é a mais grave desde 1994, com endividamento médio por produtor atingindo R$ 2,5 milhões, contra R$ 1,8 milhão em 2023.

 

Indicador20232025 (até set.)Variação
Endividamento Médio (R$ mi/produtor)1,82,5+38%
Inadimplência Crédito Rural3,5%4,4%+25%
Margem Líquida Soja/Milho25%15%-40%
Custos InsumosR$ 8 mil/haR$ 10,5 mil/ha+31%

Foto: Produtor analisando planilhas financeiras em fazenda de Mato Grosso do Sul - Arquivo Canal Rural

Impactos no Crédito Rural e Setor Financeiro

O endividamento pressiona a cadeia de crédito, com cooperativas reportando inadimplência de 5-7% e bancos como o Sicredi e Banco do Brasil revisando carteiras. O governo, que financiava 60% via Plano Safra, reduziu participação para 45% em 2025, abrindo espaço para o privado – mas com maior risco. Tradings e revendas de insumos, que concedem crédito de curto prazo, enfrentam calotes de 10%, afetando sua liquidez.

Instituições financeiras acendem "sinal vermelho": o Banco Central elevou provisões para perdas em 20% para o agro. Cooperativas, que detêm 45% do crédito rural, renegociam 30% das dívidas, mas alertam para "efeito dominó" em fornecedores.

  • Efeitos Imediatos:
    • Cautela em novas linhas: Bancos limitam empréstimos a produtores com garantias reais (imóveis, safra futura).
    • Renegociações: 25% das dívidas rurais reestruturadas em 2025, com carência de 12 meses.
    • Mercado de capitais: Debêntures agro emitidas caíram 15%, de R$ 50 bi para R$ 42,5 bi.

Eric Emiliano, sócio da L.E.K. Consulting, analisa: "O agricultor brasileiro é muito resiliente. Já passamos por outros ciclos de aperto e o setor sempre se adapta. A retomada vai depender de fatores como o aumento da produtividade, que é essencial para melhorar o resultado dentro da porteira."

Transição no Modelo de Financiamento: Do Governo ao Privado

A diminuição da participação estatal (de 60% para 45%) reflete a maturidade do agro, mas exige adaptações. Bancos e mercado de capitais assumem papéis maiores, trazendo especialização, mas com exigência de garantias estruturadas (como CPRs eletrônicas e fundos garantidores). Indústrias de insumos e tradings focam em seu core business, delegando crédito a especialistas.

Emiliano complementa: "A agricultura cresce mais rápido do que a capacidade do governo de ampliar recursos. Por isso, outros agentes da cadeia, como indústrias de insumos, tradings e instituições financeiras, vêm assumindo papel maior no crédito rural. Mesmo assim, acreditamos que uma participação maior dessas instituições é positiva, porque traz especialização financeira e deixa a cadeia de insumos e tradings focada em suas atividades principais."

  • Novos Modelos:
    • Garantias inovadoras: Uso de blockchain para CPRs e seguros paramétricos.
    • Mercado de capitais: Debêntures incentivadas crescem 10%, mas com spreads mais altos (3-5%).
    • Cooperativas: Renegociam 40% das carteiras, com foco em produtores de pequeno e médio porte.

Perspectivas: Resiliência e Caminhos para a Recuperação

O setor projeta recuperação em 2026, com produtividade subindo 5% via tecnologia (drones, IA) e preços de commodities se estabilizando. A inadimplência deve cair para 3% com safras recordes, mas exige diversificação (de soja para orgânicos e bioeconomia). O governo planeja Plano Safra 2026 com R$ 400 bilhões, priorizando sustentabilidade.

Emiliano conclui: "Os modelos de financiamento vão ficar mais complexos, tanto na origem dos recursos quanto nas formas de garantia. Isso é sinal de um mercado que está evoluindo."

Desafios persistem: clima adverso e geopolítica (tarifas EUA-China), mas o agro brasileiro, com US$ 150 bilhões em exportações anuais, tem ferramentas para navegar a crise.

 

Fator de RecuperaçãoProjeção 2026Estratégia
Produtividade+5%Adoção de tech (IA, drones)
Preços CommoditiesEstabilização +3%Diversificação culturas
Crédito RenovadoR$ 450 biGarantias digitais e seguros
Inadimplência-1 ppRenegociações e monitoramento